Páro, arfante e cansado, no meio de uma ponte de madeira. Uma das duas que existem no parque. No meio do lago, apenas se vê um pato. Estamos no início da primavera e o lago não merece mais do que um simples pato. E ali nos encontramos. Sós. Ele sozinho no meio da água, eu sozinho no meio da ponte.
Estou a meio da minha corrida diária e este é o meu ponto de paragem para alongamentos e algum descanso. Gosto deste lugar. No inverno não se vê vivalma. No verão é onde se encontram aqueles com mais primaveras que decidem jogar dominó ou pôr a conversa em dia. A conversa que é sempre a mesma, contada de mil e uma maneiras diferentes. A conversa que espera sempre por alguma novidade, carente da aldeia onde vive.
O meu olhar levanta-se do chão e prende-se num pequeno banco do outro lado do lago. Foi ali que uma vez me levantei e deixei para trás o grande sentimento que sentia. Foi ali que o perdi e é ali que ele permanece, angustiante, estendendo-me os braços à espera que o vá buscar. Não, não vou porque não quero. Porque decidi escolher a felicidade ao invés do amor e dele não tenho sentido falta. Com ele ficaste tu, de ti lembro-me eu todos os dias. Porque no final fica só aquela boa lembrança de que tudo aconteceu e dos nossos momentos apenas guardo os melhores. Ficam os muitos ovos de kinder que escondemos um do outro nas milhares de caça ao tesouro que organizámos. Ficam os pinguins que imitámos e que decidimos ser antes das coisas não correrem como previsto. Ficam as mãos dadas e os sorrisos partilhados de coração cheio. Ficas tu.
Tudo porque escolhi não te voltar a ver depois disso. Uma decisão infantil mas necessária.
Olho para o céu. Cinzento. Está na hora de continuar a correr. Os músculos já doem, mas não me impedem de continuar. Não impedem porque não passa disso. De uma simples dor. E eu tenho uma corrida para acabar.