Quando escrevemos alguma coisa tem de ser algo que venha do nosso interior, algo que a voz da nossa consciência nos dite, por isso é que, um sonhador tem uma grande perturbação no seu interior: A escrita está para ele como o óleo está para o carro.
Hoje voltei a ouvir os meus antigos discos de vinil, aqueles que são impermeáveis ao tempo, e a minha voz cá de dentro falou-me baixinho ao ínicio, depois aos berros, depois intrecalou-se e agora estou aqui, graças a ela, debruçada sobre este teclado onde as palavras me surgem tão suavemente, quase sem ser preciso esboça-las.
Às vezes as pessoas usam-nos. Acham-se senhores da sua barriga e da nossa também, somos obrigados a esperar por quem não espera por nós, somos obrigados a gostar de quem não gosta de nós e quando a nossa paciência termina (sim, é verdade que todas elas têm um limite) as pessoas não aceitam. Continuam a querer que nós sejamos as suas marionetas, num espectáculo que atribuir todos os lucros a elas.
Quando nós nos cansamos, as pessoas nunca compreendem, e no palco onde eramos usados gritamos a glória que antes queriamos ter tido , por sermos humildes e humanos ! Mas os realizadores nunca nos aceitam assim, nunca aceitam que lhes mostremos que somos dignos de algo mais. A partir desse momento, a nossa vida torna-se um verdadeiro inferno. Sim! O inferno que existe são as pessoas da Terra que o fazem. Se a morte lhes batesse à porta , tenho a certeza que pensariam na sua vida de outra maneira, que a moldariam à maneira do coração e que humilhar os outros não seria a primeira coisa que lhes aparecesse à frente. Mas é mesmo assim : Nós não podemos mudar o que as pessoas nos fazem, mas podemos ser superiores, devido aquilo que podemos fazer.
Um dia a consicência acaba por falar, tenham passado 1 ou 30 anos, vão voltar a bater à nossa porta, não para fazer mal, não para voltar ao palco, mas sim para deixar uma orquídea à nossa porta. Talvez o tempo já não esteje para eles, mas pelo menos estará sempre pronto a dizer-nos que a culpa não foi nossa.
Da última vez que me lembro de mim tinha uma arma apontada ao meu coração. Não era uma arma daquelas que disparam e nos matam de verdade, mas a sensação de insegurança, de medo, de suores frios, de saber que a nossa vida podia acabar ali, naquele momento, era a mesma do que a de ter uma arma onde o seu gatilho estaria quase a ser premido. Foi uma fase da minha vida! Uma fase em que tive de dizer que chega porque tinha de chegar, porque sofrer já era demais.
Tem de haver uma altura da vida em que nós digamos que chega e na realidade , chega mesmo. Não podemos passar os dias a dizer chega , acabou e na hora asseguir voltar ao mesmo. Quando eu dizia que chegava era exactamente assim: voltava a cometer o mesmo erro, uma e outra vez, e nunca me chegava. Até que um dia olhei a janela com outros olhos, não me perguntem como, porquê ou onde, mas a verdade é que eu acordei com outra vontade , com uma vontade de ser livre, de largar as correntes que me prendiam, de desviar com a própria mão essas armas que me apontavam ao coração e que ele, mole, frágil, acabaria por ceder. Não me perguntem o que me levou a tomar essa decisão mas uma coisa é certa, todos nós acabamos por a receber. É como uma dádiva que alguém nos incumbe de levar àvante.
Caso falhemos , ninguém poderá apontar o dedo à nossa cara, ou rir-se, aliás, poderá fazê-lo mas de nada adiantará pois aquilo que guardamos dentro de nós, aquilo que conseguimos pela luta de nós próprios, pelo suor que escorreu no nosso corpo a escalar a montanha, a correr nos bastidores de um presente será mais forte, mais forte que os outros, mais forte que nós.
(amanhã estarei pelo correio do minho gente)