O dia, que horas antes era cintilante e fabuloso, escureceu. Não se viam pessoas na rua. Provavelmente estariam em suas casas, descansadas da agitação do dia-a-dia. Os carros, esses, eram escassos. O silêncio era totalmente ensurdecedor. Apenas os postes de electricidade iluminavam aquele pedaço de base, onde decorria a minha/nossa vida. E eu. Um dos poucos seres vivos que ali estava, no meio da escuridão e desprezo da agitação. O ar gélido arrefecia-me os braços, os lábios começavam a dar os primeiros sinais de desidratação e o meu corpo enquadrava-se numa melodia onde a orquestra estava afinada e coordenada em relação ao frio. Bancos de jardim ali estavam. A solidão era a sua companhia e a tinta renegava continuar a fazer parte de si. Sem querer ser parecida com algo que ali estivesse, decidi então fazer-lhe companhia. Sentei-me, ouvi o que ele me disse até ao fim e o calor das memórias e recordações começou a aquecer-me o coração. Ele, no silêncio e confortabilidade que me oferecia, trouxe-me um Passado apagado a um Presente ainda a ser escrito. Li, vi e senti o que essas memórias e recordações me proporcionaram no passado e o que me proporcionam agora. O sentido, a intensidade não é a mesma. Já não sinto o que sentia. Dava tudo para voltar a reviver os melhores momentos e para não voltar a pisar os caminhos que me levaram ao desespero e desinteresse pela vida. Vivo um presente completamente fantástico, e espero num futuro longínquo não dizer mal do que estou a viver agora. Certamente não o direi, mas tenho a perfeita noção que a vida é composta por altos e baixos. É uma inconstante total onde nós vagueamos por onde nos levam, por onde queremos ir, por onde nos deixam e por onde somos capazes. No fundo é um teste à nossa integridade e inteligência. Um jogo real onde jogamos com utensílios, sentimentos e pessoas reais. A realidade, a protagonista.
De repente, o sol inunda-nos de luminosidade...
Levanto-me, sem querer, do banco de jardim e num passo acelerado vou para casa. Durante o percurso comparo o que me rodeia que antes era escuro e solitário, e que numas horas se tornou claro e agitado. Admirava tudo aquilo não com orgulho mas sim com um ar de interrogação. Como é que seria possível aquela rua se mascarar assim, tão rapidamente e se tornar noutra completamente diferente. Era inimaginável, mas real.