sexta-feira, 24 de julho de 2009


E anos depois, ele provou a todos que aquilo não era assim tão efémero, tão pequeno, tão vulgar. Não tinha dito “amo-te” a muito mais gente, mas, na verdade, tinha caído no erro da maioria das pessoas desta actual e pouco inteligente sociedade de retirar o valor àquela palavra, e pronunciá-la sem a real noção do que sentia pelas mulheres que teve do seu lado. Nenhuma delas ele realmente tinha amado; admirado e respeitado talvez.
Naquela noite ele tinha voltado a sonhar pela milésima vez com a mesma coisa. O sonho era sempre o mesmo, de tal modo que quando acordava só sabia que tinha realmente sonhado com ela, se ao acordar tivesse ainda na cabeça a imagem daqueles olhos verdes. Uns afirmavam que era obsessão, paranóia incurável de tão recalcada que estava nele aquela relação inacabada. Mas ele sempre teve consciência de que aquela relação, interrompida do nada por uma coisa de nada, teria que ser acabada um dia; a bem ou a mal, ela teria que levar um ponto final para que os dois pudessem seguir com as suas vidas, juntos ou… a sós.
O sol tinha já levantado. Eram 7 da manhã, e depois de passar pelo Lobbie do hotel, onde cumprimentou e trocou dois dedos de conversa com um velho amigo que já não via há anos, dirigiu-se à sala de pequenos almoços, onde leu o jornal e tomou a primeira refeição do dia. Tudo parecia decorrer como o habitual neste sétimo dia de férias, férias estas que estavam agora a chegar ao fim. Nova Iorque era aquela cidade que ele imaginava. Um pouco mais “real” do que aquilo a sua cabeça tinha sonhado, porém perfeita mesmo assim…
Momentos mais tarde, eram 8 da manhã, ele saía do hotel, em direcção ao rio. Era o último dia ali, e ele queria estar num sítio sossegado onde pudesse lamentar por umas férias que mais uma vez não lhe tinham trazido nada de útil. Ficar a ver os barcos a vaguear pelo rio da cidade era bom. Mas sempre que se encontrava sozinho voltava aquela tão velha e habitual sensação de perda, de solidão, de incompreensão. Daquela vez, porém, a sensação não durou muito, ou talvez se tenha transformado repentinamente. Parecia que, de repente, o sol brilhava ainda mais, que o vento tinha parado, talvez o mundo, e nem os sons ouvia. Não era nada que não tivesse pensado já, afinal sonhava com aquilo todos os dias. Era, efectivamente a paixão da sua vida. O mesmo olhar, o mesmo andar e maneira de estar. Parecia tão irreal, e embora já tivesse ouvido falar de histórias reais parecidas, não pensava que aquele sonho pudesse virar de facto realidade. Caminhava, naquele momento, em direcção a ela, ao mesmo tempo que comparava a realidade àquele sonho de tantos anos. Quando se encontravam a meros centímetros de distância, ele levou a mão à cara dela, comprovando de que não se tratava de um sonho. Não se tratava mesmo de um sonho.
- Eu sabia que te encontraria aqui.
- Pensei que nunca mais te visse.
- Lembras-te de quando me disseste se no futuro eu estaria tão distante como aquelas luzes que vimos no horizonte, na praia? Eu prometi a mim mesmo nunca me distanciar tanto como aquelas luzes, e que se alguém tivesse que se afastar terias de ser tu.
- Esperaste por estes anos todos…
- Éramos crianças. Eu não podia exigir muito mais de nós.

Era 8 de Setembro e naquele dia deu-se um eclipse, visto por quase todo o continente americano. Aos poucos a cidade veria o dia transformar-se em noite. Nova Iorque ficou totalmente absorta pela escuridão.

5 comentários:

  1. simplesmente FANTA'STICO :D

    adorei mesmo o texto =)

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  2. Afonso, reconhecivel em qualquer lado esta tua escrita sempre sincera, sempre um trago amargo no doce. Sempre o romantismo e o sonho. A lucidez, a lição de vida. Adorável.

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  3. Gostei muito do texto, está como a Pêjotinha' disse amargo no doce. Muito bom mesmo!

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  4. Esse amor Afonso. Tenho-te lido tanto que sinto-o como uma doçura que não me pertence, mas que me inspira.

    Escreves como poucos*

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